Entre xícaras e lembranças

Era uma daquelas tardes mágicas de outono, quando o sol, cansado de brilhar, se despedia mais cedo, tingindo o céu de um laranja suave e acolhedor. Na cozinha, Dona Maria, com seus cabelos prateados que reluziam à luz morna da tarde e olhos que guardavam um mundo de histórias, preparava a sua receita favorita: café. O aroma encorpado do café fresco começava a se espalhar pela casa, trazendo com ele uma onda de lembranças de tempos idos.

Sentada à mesa, ela olhava pela janela e observava a dança das folhas que, num balé lento e gracioso, deslizavam das árvores em direção ao chão. Em seu coração, as memórias de dias felizes se aglomeravam, quando seus filhos corriam pelo quintal, suas risadas ecoando como música. Agora, a casa estava envolta em um silêncio sereno, quebrado apenas pelo tic-tac do relógio de parede e o canto distante dos pássaros que se acomodavam para a noite.

De repente, o sino da porta tocou, trazendo um sorriso ao rosto de Dona Maria. Era João, seu neto, que a visitava religiosamente todas as tardes. Ele entrou com um sorriso radiante e um abraço apertado que a fazia sentir-se tão amada. Sentaram-se à mesa e, com gestos carinhosos, ela serviu o café fumegante, acompanhando-o com biscoitos caseiros que exalavam o conforto do lar.

Enquanto conversavam, João contava com entusiasmo sobre suas aventuras na escola, os amigos novos que fizera e os sonhos que o aguardavam no futuro. Dona Maria ouvia cada palavra com atenção, seus olhos brilhando de orgulho e amor. Compreendia que o tempo voava e que cada instante ao lado de João era um tesouro que valia a pena guardar.

A tarde passava lentamente, e o sol, em sua descida, parecia pintar o horizonte com tons cada vez mais profundos. Quando chegou a hora da despedida, João beijou a testa da avó, prometendo voltar no dia seguinte. Dona Maria permaneceu à mesa, olhando fixamente para a xícara de café vazia, sentindo um misto de saudade e gratidão. Saudade pelos momentos que já haviam passado e gratidão por aqueles que ainda teria.

Levantou-se, guardou as xícaras e se dirigiu até a janela. Observou as estrelas começando a brilhar no céu profundo, como se cada uma delas fosse uma lembrança cintilante. E, num gesto de paz, sorriu, sabendo que, apesar do tempo que avança sem compaixão, as memórias e o amor que compartilhava com a sua família permaneceriam eternamente.


Autor Lyu Somah

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